Quem é a socióloga que morou no 1º assentamento de revisão agrária do país e estudou como o projeto acabou ‘da noite para o dia’on dezembro 4, 2023 at 1:31 pm
- dezembro 4, 2023 Professora universitária com pós-doutorado na Itália, Célia Tolentino morou em área rural criada a partir de lei que reviu posse de terras improdutivas no estado. Socióloga que morou em assentamento da revisão agrária paulista estudou projeto
A socióloga e professora aposentada da Unesp Célia Aparecida Ferreira Tolentino fez da própria “casa” um objeto de estudo ao longo da trajetória acadêmica. Isso porque morou no primeiro assentamento montado pelo governo de São Paulo por meio da lei que revisou a posse de terras improdutivas em 1960 e escreveu mestrado sobre o tema. Ao revisitar o assunto 30 anos depois, avalia que o programa poderia ter transformado a forma de produção rural do estado se não tivesse sido encerrado “da noite para o dia” com manobras políticas.
De líder estudantil a comunicador: fundador da EPTV deixou legado ao aliar TV e educação
Idealizador do projeto de revisão agrária em SP, o empresário e fundador da EPTV, José Bonifácio Coutinho Nogueira, completaria 100 anos neste domingo (3). Ele criou o programa quando foi secretário Estadual de Agricultura no governo de Carvalho Pinto.
À época da criação da lei, o debate sobre a posse de terras rurais improdutivas era central na política brasileira. Coutinho Nogueira partiu da premissa de que era preciso reduzir grandes propriedades improdutivas no estado sem gerar “convulsão social”, segundo Célia.
A correlação entre a vida da pesquisadora e a do empresário tem a óbvia centralidade na lei que revisava a posse de terras rurais improdutivas. O projeto, segundo Célia, era corajoso, modernizador no âmbito econômico e conservador no caráter político.
A professora, que atualmente mora na Itália, onde fez pós-doutorado, morou com os parentes em um dos 113 lotes de 20 hectares do assentamento Fazenda Santa Helena, em Marília (SP). O pai dela, agricultor familiar, comprou a terra em 1964 e viveu nela até 1981.
José Bonifácio Coutinho Nogueira, foi secretário de Agricultura e, depois, candidato a governo do estado de São Paulo
Arquivo Pessoal
Como funcionava a revisão?
Como o imposto territorial rural era responsabilidade do estado, a lei determinava que as terras improdutivas fossem taxadas de forma mais incisiva e o dinheiro arrecadado seria usado com viés social, financiando indenizações de desapropriações.
Os beneficiários seriam ligados às terras, ou seja, trabalhadores rurais que entendiam os processos de produção – como era o caso do pai de Célia Tolentino.
“Ele [Coutinho Nogueira] tinha um projeto de modernização do campo e da indústria e [queria] que os dois setores colaborassem entre si de forma organizada”, resumiu a pesquisadora.
Assentamentos
Célia Aparecida Ferreira Tolentino é professora aposentada da Unesp de Marília
Reprodução/Skype
Coutinho Nogueira relatou, em entrevista de 1997, que a revisão agrária criou “cinco ou seis assentamentos”. Segundo a socióloga, dois foram modelares: um em Valinhos e outro, o primeiro deles e considerado projeto-piloto, em Marília (SP).
Em Marília, a propriedade que se tornou assentamento já tinha sido adquirida pelo estado quando foi loteada para a revisão agrária. Também já havia sido alvo de ocupação de movimentos sem-terra.
Cada lote foi vendido por valor menor que o praticado pelo mercado e com infraestrutura montada, mas os produtores tinham regras a seguir. O prazo para pagamento das terras era de 15 anos.
Segundo um artigo publicado por Célia, a divisão dos 20 hectares se dava da seguinte maneira:
1,25% – sede e moradia
1,75% – criação de suínos
1,25% – criação de aves
2% – reflorestamento
32% – milho
16% – amendoim
16,00% – milho ou leguminosas (feijão, batata)
13,50% – mandioca
15,00% – pasto
1,25% – caminho
As propriedades possuíam casa de alvenaria, silo e infraestrutura para produção não extensiva. No assentamento havia um salão social destinado a festas familiares, conferências.
Como era viver no assentamento?
Socióloga que morou e estudou revisão agrária conta como é viver em assentamento
A pesquisadora conta que a falta, como a família se mudou para a fazenda já em um período de derrocada do projeto, a falta de assistência do governo prejudicou a produção e as contas. Por algum tempo, a família viveu certa dificuldade.
Foi na transição da produção de amendoim para hortifrútis diversos que o pai de Célia conseguiu se estabilizar. Além disso, ele passou a vender os produtos em feiras, o que ampliou os ganhos. Mesmo estudando na cidade, Célia – junto de toda a família – auxiliava no manejo das plantações.
Ela se formou na escola e ingressou na faculdade de ciências sociais da Unesp de Marília. Antes mesmo de se formar na graduação, passou a se interessar por reforma agrária, mas só se deu conta de que tinha envolvimento direto no assunto quando foi perguntada sobre isso.
“Evidentemente, eu queria fazer um estudo sobre o tema. Talvez eu fosse estudar a reforma agrária como questão nacional porque o movimento dos sem-terra começou a colocar a pauta, de novo, na arena política. Mas não tinha me dado conta do envolvimento”.
“[Estudar a revisão agrária] Foi a melhor coisa que eu fiz, porque foi um dos primeiros estudos sobre o assunto”.
Por que foi encerrado?
A revisão agrária partiu da lógica de que o imposto sobre a posse da terra rural era responsabilidade do estado. Segundo Célia Tolentino, no ano seguinte à criação da lei, o Congresso Nacional reviu essa questão e deu ao governo federal a missão de ordenar o tributo.
“Foi uma manobra política importante porque uma ala politicamente conservadora atuou para suprimir o imposto territorial rural que seria financiador de todo esse projeto para a União. (…) O imposto que era recolhido em São Paulo foi para a União”, explicou Célia.
“Foi na calada da noite que essa transferência, a recolha do imposto de São Paulo para a União”, completou. Sem a principal renda para manutenção do projeto, o número de assentamentos não cresceu.
Além disso, segundo a pesquisadora, o governador Adhemar de Barros, que venceu o então candidato Coutinho Nogueira e sucedeu Carvalho Pinto, removeu o investimento que garantia a assistência aos lavradores. Com isso, houve o enfraquecimento da cooperativa do assentamento.
O que teria acontecido?
Revisão agrária de SP transformaria produção se tivesse sido mantida, diz socióloga
Veja mais notícias da região no g1 CampinasProfessora universitária com pós-doutorado na Itália, Célia Tolentino morou em área rural criada a partir de lei que reviu posse de terras improdutivas no estado. Socióloga que morou em assentamento da revisão agrária paulista estudou projeto
A socióloga e professora aposentada da Unesp Célia Aparecida Ferreira Tolentino fez da própria “casa” um objeto de estudo ao longo da trajetória acadêmica. Isso porque morou no primeiro assentamento montado pelo governo de São Paulo por meio da lei que revisou a posse de terras improdutivas em 1960 e escreveu mestrado sobre o tema. Ao revisitar o assunto 30 anos depois, avalia que o programa poderia ter transformado a forma de produção rural do estado se não tivesse sido encerrado “da noite para o dia” com manobras políticas.
De líder estudantil a comunicador: fundador da EPTV deixou legado ao aliar TV e educação
Idealizador do projeto de revisão agrária em SP, o empresário e fundador da EPTV, José Bonifácio Coutinho Nogueira, completaria 100 anos neste domingo (3). Ele criou o programa quando foi secretário Estadual de Agricultura no governo de Carvalho Pinto.
À época da criação da lei, o debate sobre a posse de terras rurais improdutivas era central na política brasileira. Coutinho Nogueira partiu da premissa de que era preciso reduzir grandes propriedades improdutivas no estado sem gerar “convulsão social”, segundo Célia.
A correlação entre a vida da pesquisadora e a do empresário tem a óbvia centralidade na lei que revisava a posse de terras rurais improdutivas. O projeto, segundo Célia, era corajoso, modernizador no âmbito econômico e conservador no caráter político.
A professora, que atualmente mora na Itália, onde fez pós-doutorado, morou com os parentes em um dos 113 lotes de 20 hectares do assentamento Fazenda Santa Helena, em Marília (SP). O pai dela, agricultor familiar, comprou a terra em 1964 e viveu nela até 1981.
José Bonifácio Coutinho Nogueira, foi secretário de Agricultura e, depois, candidato a governo do estado de São Paulo
Arquivo Pessoal
Como funcionava a revisão?
Como o imposto territorial rural era responsabilidade do estado, a lei determinava que as terras improdutivas fossem taxadas de forma mais incisiva e o dinheiro arrecadado seria usado com viés social, financiando indenizações de desapropriações.
Os beneficiários seriam ligados às terras, ou seja, trabalhadores rurais que entendiam os processos de produção – como era o caso do pai de Célia Tolentino.
“Ele [Coutinho Nogueira] tinha um projeto de modernização do campo e da indústria e [queria] que os dois setores colaborassem entre si de forma organizada”, resumiu a pesquisadora.
Assentamentos
Célia Aparecida Ferreira Tolentino é professora aposentada da Unesp de Marília
Reprodução/Skype
Coutinho Nogueira relatou, em entrevista de 1997, que a revisão agrária criou “cinco ou seis assentamentos”. Segundo a socióloga, dois foram modelares: um em Valinhos e outro, o primeiro deles e considerado projeto-piloto, em Marília (SP).
Em Marília, a propriedade que se tornou assentamento já tinha sido adquirida pelo estado quando foi loteada para a revisão agrária. Também já havia sido alvo de ocupação de movimentos sem-terra.
Cada lote foi vendido por valor menor que o praticado pelo mercado e com infraestrutura montada, mas os produtores tinham regras a seguir. O prazo para pagamento das terras era de 15 anos.
Segundo um artigo publicado por Célia, a divisão dos 20 hectares se dava da seguinte maneira:
1,25% – sede e moradia
1,75% – criação de suínos
1,25% – criação de aves
2% – reflorestamento
32% – milho
16% – amendoim
16,00% – milho ou leguminosas (feijão, batata)
13,50% – mandioca
15,00% – pasto
1,25% – caminho
As propriedades possuíam casa de alvenaria, silo e infraestrutura para produção não extensiva. No assentamento havia um salão social destinado a festas familiares, conferências.
Como era viver no assentamento?
Socióloga que morou e estudou revisão agrária conta como é viver em assentamento
A pesquisadora conta que a falta, como a família se mudou para a fazenda já em um período de derrocada do projeto, a falta de assistência do governo prejudicou a produção e as contas. Por algum tempo, a família viveu certa dificuldade.
Foi na transição da produção de amendoim para hortifrútis diversos que o pai de Célia conseguiu se estabilizar. Além disso, ele passou a vender os produtos em feiras, o que ampliou os ganhos. Mesmo estudando na cidade, Célia – junto de toda a família – auxiliava no manejo das plantações.
Ela se formou na escola e ingressou na faculdade de ciências sociais da Unesp de Marília. Antes mesmo de se formar na graduação, passou a se interessar por reforma agrária, mas só se deu conta de que tinha envolvimento direto no assunto quando foi perguntada sobre isso.
“Evidentemente, eu queria fazer um estudo sobre o tema. Talvez eu fosse estudar a reforma agrária como questão nacional porque o movimento dos sem-terra começou a colocar a pauta, de novo, na arena política. Mas não tinha me dado conta do envolvimento”.
“[Estudar a revisão agrária] Foi a melhor coisa que eu fiz, porque foi um dos primeiros estudos sobre o assunto”.
Por que foi encerrado?
A revisão agrária partiu da lógica de que o imposto sobre a posse da terra rural era responsabilidade do estado. Segundo Célia Tolentino, no ano seguinte à criação da lei, o Congresso Nacional reviu essa questão e deu ao governo federal a missão de ordenar o tributo.
“Foi uma manobra política importante porque uma ala politicamente conservadora atuou para suprimir o imposto territorial rural que seria financiador de todo esse projeto para a União. (…) O imposto que era recolhido em São Paulo foi para a União”, explicou Célia.
“Foi na calada da noite que essa transferência, a recolha do imposto de São Paulo para a União”, completou. Sem a principal renda para manutenção do projeto, o número de assentamentos não cresceu.
Além disso, segundo a pesquisadora, o governador Adhemar de Barros, que venceu o então candidato Coutinho Nogueira e sucedeu Carvalho Pinto, removeu o investimento que garantia a assistência aos lavradores. Com isso, houve o enfraquecimento da cooperativa do assentamento.
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